Em meio ao caos total, Clément Champoussin (AG2R) venceu a 20ª etapa da Vuelta 2021, em uma etapa com cara de clássica Monumento. Tivemos um pouco de tudo: subidas, descidas, ataques…ciclistas quebrando, recuperando-se, alguns conquistando lugar no pódio, outros abandonando toda esperança. Essa loucura e explosividade reúne tudo aquilo pelo qual amamos as Grandes Voltas. Esse tipo de evento, que é sem igual em meio aos esportes, é das realizações mais extremas que um ser humano é capaz.

Para começar, são 3 semanas. 21 dias de prova com apenas dois descansos entre eles. E diversos tipos de etapas. Contrarrelógio, sprint, média montanha, alta montanha, chegada ao alto. E cada dia é um grande prêmio com sua própria disputa. É como uma mistura de Fórmula 1, maratona, 100 metros rasos e escaladas. Tudo junto e misturado, dia após dia. É preciso ser um ciclista extremamente capaz, para vencer uma etapa. Mais ainda para ser campeão da Classificação Geral. Correr durante três semanas em altíssimo nível sem ceder tempo aos rivais ou recuperando-se após ter um ou dois dias ruins. E, ainda, saber surfar em meio a todos os diversos interesses que podem interferir no decorrer da prova. São ciclistas disputando a Camisa de Montanha, a Camisa de Pontos, alguns brigando pelo top 10 e outros por etapas. E claro, a vitória na Classificação Geral, ou seja, o campeão máximo da corrida.

Vamos usar como exemplo a corrida de hoje e dividir em três partes para tentar explicar um pouco do que são essas feras como Tour, Vuelta e Giro.

Primeira parte

A primeira semana é onde as coisas procuram se estabelecer. Todos largam mais ou menos iguais e motivados, portanto a corrida fica frenética. Vencer uma etapa ou carregar a Camisa de Líder é um objetivo para quase todas as equipes, a briga é intensa e entre muita gente.

A disputa inicial é sempre acirrada (Luis Angel Gomez / Photogomezspo)

Da mesma forma, o começo da etapa de hoje foi bem disputado. Depois de várias tentativas, um grupo grande se formou, com Michael Storer e Romain Bardet (DSM), Matteo Trentin (UAE), Mikel Bizkarra (Euskatel), Clément Champoussin, entre outros. Storer e Bardet, além da vitória da etapa, buscavam somar pontos para garantir a Camisa de Montanha. Os melhores na Classificação Geral, apenas controlam a vantagem, administrando as forças e esperam a hora de fazer suas movimentações.

Segunda parte

A segunda semana é onde as coisas geralmente parecem encaminhadas e algumas surpresas podem surgir. O cansaço começa a tomar conta e os ciclistas que começaram à frente sentem os efeitos do esforço feito. Alguns tentam movimentos desesperados para ir em busca da vitória e outros ficam pelo caminho.

Grupo se destaca do pelotão (Luis Angel Gomez / Photogomezspo)

Hoje Matteo Trentin começou as acelerações na fuga, enquanto que a Ineos assumiu essa função no pelotão. A vantagem da fuga caía enquanto que o grupo do Camisa Vermelha e o da fuga, diminuíam com o passar dos quilômetros e das montanhas. Ao entrar na parte decisiva da prova, a frente estava com um pequeno grupo composto por Bardet, Ryan Gibbons (UAE), Mark Padun (Bahrain-Victorious) e Lilian Calmejane (AG2R). O pelotão reduzido tinha acelerações iniciadas por Egan Bernal (Ineos Grenadiers) e seguidas por Primoz Roglič (Jumbo Visma). Em determinado momento, a Bahrain assumiu com Gino Mäder e Jack Haig, Roglič, Adam Yates (Ineos Grenadiers) e Enric Mas (Movistar) seguiram enquanto que Egan Bernal e Superman López (Movistar) ficavam para trás. Aí, o drama tomou conta.

Parte final

A terceira semana é onde o caos reina. Confirmações de quem era o mais forte, abandonos, vitórias e reviravoltas, o cansaço acumulado e o ponto de fusão mental, devido ao estresse de tantos dias no limite, colocam tudo à beira do caos. A terceira semana de uma grande volta é como pendurar-se no abismo. Você pode sair com vida, mas o mínimo vento pode pôr tudo a perder.

Quando Jack Haig (Bahrain-Victorious) ficou à frente de Bernal e Miguel Ángel López, o pódio da Classificação Geral começou a mudar. A partir daí, o que vimos foi o clássico desespero tomar conta. Um lugar no pódio vale muito e ninguém quer perdê-lo no penúltimo dia. No grupo do Camisa Vermelha, Gino Mäder trabalhava impondo um ritmo infernal. Ángel López, atrás e sem gregários tinha que trabalhar ou perderia sua posição na Classificação Geral. Bernal tinha Adam Yates à frente e portanto não colaborava.

Gino Mäder, Jack Haig, Enric Mas e Primoz Roglic (Luis Angel Gomez / Photogomezspo)

Na fuga, Ryan Gibbons atacou e rodou solo tentando a vitória do dia. Storer somou o máximo de pontos que pôde e assegurou a Camisa de Bolinhas. Mark Padun começou a esperar Haig e Mäder para ajudar e outros remanescentes da fuga ficaram entre os grupos.

Atrás, Lopez perseguia o grupo do Camisa Vermelha, até que de repente começaram a surgir informações que o Colombiano havia parado e iria desistir da corrida, enquanto que Patxi Vila, diretor da equipe, tentava convencê-lo a retomar a bicicleta. O pódio estava já fora de cogitação, mas o ciclista ainda poderia conquistar um top 10. Porém, nada o fez mudar de ideia.

O pelotão chegou à subida final cerca de 1 minuto atrás de Gibbons e ainda com outros ciclistas à frente, como Bizkarra e Champoussin. Os favoritos começaram a se atacar ao passo que a vantagem do ciclista da UAE diminuía. Vários ataques se alternaram e os ciclistas da fuga iam se incorporando ao pelotão. Roglič, sempre o mais forte, respondia, mas já não tinha ambições para carregar os outros com ele e decidiu parar. Em determinado momento, Gibbons foi capturado, manteve-se no grupo e tentou acelerar novamente, para outra vez ser alcançado. Bizkarra também tentou, sem êxito. Quando a vitória parecia ficar para os favoritos da Classificação Geral, Champoussin se aproveitou de um momento em que os rivais se marcavam e lançou um poderoso ataque para surpreender a todos e levar a primeira e incrível vitória no World Tour. Roglič foi o segundo, batendo os outros na chegada, como esperado. Enric Mas chegou logo após com Adam Yates à frente de Haig, que agora ocupava o terceiro lugar na GC.

Clément Champoussin (AG2R) no pódio (Luis Angel Gomez / Photogomezspo)

Quanto a Superman López, ainda não se sabe ao certo o que causou o abandono. Há versões que dizem que a equipe o mandou parar de perseguir o grupo e por isso ele se revoltou. Superman deu algumas declarações duras sobre a equipe em entrevistas, mas fato é que nos deu mais motivos para aguardar a próxima temporada da série da Netflix. A Movistar começou o dia com dois ciclistas no pódio e terminou com apenas um e uma crise de imagem para resolver.

A Vuelta que parecia resolvida, viu Ángel López abandonar a corrida e Bernal dar adeus às chances de top 5 e a Camisa Branca. Viu também uma etapa de mais de 200 quilômetros e ação do começo ao fim em um dos melhores dias do calendário ciclístico. No fim de três semanas e milhares de quilômetros, tudo pode mudar. E essa é a beleza das grandes voltas. A cada esquina e cada montanha, sempre há a possibilidade de uma reviravuelta.

Próxima Etapa 21

Padrón > Santiago de Compostela
33,8 km – Contra-relógio individual (CRI/ITT)

Percurso semelhante para a fase final da Vuelta 1993, que também partiu de Padrón e terminou em Santiago de Compostela. A primeira metade consiste em uma subida contínua e a segunda inclui mais trechos de descida. O percurso, sinuoso e técnico, pode ser um fator determinante no que diz respeito ao resultado final da corrida.

Acompanhe o ReviraVuelta

Você pode ouvir e seguir a corrida com a gente via Twitter Spaces no nosso #REVIRAVUELTA. Diariamente, a partir das 12:15h (Brasília), 16:15h (Lisboa) ou 17:15h (CET), você acompanha os quilômetros finais do dia com um breve bate-papo pós-etapa, trazendo o melhor do que rolou. O programa que é como uma sala de áudio onde todo mundo pode entrar e ouvir a conversa, conta com a moderação do Junimba Simões e as análises do Allan Almeida pelo BikeBlz e do Davide Gomes e Tiago Ferreira do Portuguese Cycling Magazine, sempre em bom e claro português do mundo. Confira!

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