A civilidade nos dá o direito, senão obrigação, de cumprimentar desconhecidos. Um sinal do reconhecimento da condição compartilhada de Ser Humano.

Os ciclistas, como Seres Humanos, levam isso a sério. Nos cumprimentamos sem pudor, sem assunto, duas, três vezes por dia. Enquanto subimos e alguém desce e depois, quando as direções se invertem. Por não saber se já ou não, damos bom-dia de ida e de volta.

Enquanto desço a Estrada Dona Castorina é meu maior prazer. Me distraio nas curvas só para dar o bom-dia. Uma vez quase bati de frente com um carro que subia e não percebeu que eu estava concentrado em Ser Humano. Não é uma tarefa fácil. Contei 127 bom-dias numa quinta-feira de tempo bom. Descendo pode ser arriscado, mas é fácil, dá pra falar. Já subindo…

Falta fôlego e, por uma questão de prioridade, e não de educação, preferimos respirar. Então, o bom-dia é gestual, com um aceno rápido ou um movimento da cabeça, para fora ou só para dentro. Por isso, nem sempre a falta de resposta deve ser mal entendida. Mas algumas, sim. Algumas pessoas, apesar de nitidamente humanas, preferem ignorar o sinal de equivalência. Difícil dizer se só por uma noite mal dormida, ou se por um vida mal nascida.

A primeira vez que percebi quanto isso é importante sobre duas rodas foi numa descida com o Zulu. Um bom-dia para cada desconhecido e uma efusiva saudação para cada amigo. Ainda não conhecia ninguém, mas entendi que nem precisava. Dali pra frente, eu que já falo muito, dou bom-dia até pra cavalo pedalando.

Desço gritando para todos, acenando com respeito, cumprimentando, saudando o dia, sendo Humano.


Foto: Flo Karr, Unsplash

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